LIMPEZA VISUAL
(Alfredo Werney)
Raramente me impressiono com as propagandas de TV. Isso porque, em geral, elas não são feitas para serem apreciadas esteticamente, mas apenas para apresentarem um determinado produto. Evidentemente, algumas delas têm a pretensão de serem bonitas visualmente, mas a verdade é que raras vezes conseguem. O modelo que ainda predomina é o que se vê nos comerciais (demasiadamente pobres!) das “Casas Bahia”: a beleza visual é suplantada pelo excesso de informações visuais e sonoras.
Ainda guardo em minha lembrança uma propaganda de grande inventividade artística. Ela me despertou muito a atenção na época em que foi lançada. Refiro-me ao comercial realizado para o sabão OMO, em que aparece um robozinho. Tudo é de uma beleza visual que agrada até os mais refinados apreciadores de cinema. Trata-se de um pequeno robô que, gradativamente, vai se humanizando até se transformar em uma criança que brinca, despreocupada, em uma poça de lama.
Toda a transformação da máquina em pessoa é estruturada com mestria. A obra visual inicia-se com o abrir de uma porta. Vemos um robozinho estático, sem muita graça. Um cachorro entra no quadro e se balança. A máquina começa a se movimentar em sincronia com a trilha musical, composta de piano e cordas suaves. A partir de então se inicia a “humanização” da máquina. O robozinho descobre o quintal da casa, começa a pisar as folhas secas no chão, brinca com a grama e com as poças d'água. Aos poucos a máquina toca nas coisas e desperta a atenção para a beleza da natureza.
Os elementos formais são de grande importância para construir o sentido da seqüência: a montagem dos planos vai mostrando o processo de transformação da máquina em criança, na medida em que o ritmo se torna mais rápido e entram novos elementos visuais no quadro. A música, de maneira eficiente, narra toda a seqüência. Novos timbres entram na trilha instrumental, o ritmo se torna mais vigoroso e as notas musicais mais intensas. É como se a música também se tornasse, pouco a pouco, menos mecânica. A explosão final do comercial é quando o robô se torna inteiramente humano. A chuva forte e a poça de água sugerem o nascimento, a descoberta das coisas.
O desfecho da propaganda é composto pela frase: Toda criança tem direito de ser criança. Porque se sujar faz bem. Há neste enunciado um interessante deslocamento do lugar-comum criado pela nossa sociedade que, em geral, ainda é pautada por uma idéia exagerada de higienização: a sujeira não é mais vista como algo ruim (como desleixo, pobreza, feiúra). Ela agora está associada, de forma poética, à humanização, à alegria e à beleza. Idéias estas que nos são apresentadas através de um perfeito equilíbrio dos elementos artísticos. Uma limpeza visual!
Fantástico, Alfredo! Transcende a intenção inicial.
ResponderExcluirComo vc sabe, gosto das do Wong Kar Wai (mas aí se trata de alguém que é um mestre da sétima arte).
O André Renato me apontou esta, que também é boa: http://www.youtube.com/watch?v=zA2Qp5DizpE
Tio Alfredo eu gostei muito!
ResponderExcluirEduarda Lima
Tio, eu achei esse vidio muito interessante!!!!!
ResponderExcluirvaleu meus sobrinhos queridos
ResponderExcluirfoi buscar mais vídeos interessantes
ótimo texto. sou um apreciador confesso de bons comerciais e este é um exemplo muito interessante.
ResponderExcluirOi Alfredo,
ResponderExcluirInteressante mesmo a propaganda como belo artístico. "Sujar faz bem" essa propaganda e suas análises devem ser enviadas aos higienistas e ao Prefeito Kasab - pois sua política de higienização consiste em expulsar do centro da cidade todos os moradores de rua.