“A Festa da Menina Morta” (2008) é um filme que me surpreendeu em alguns aspectos. Mas, em geral, possui muitos problemas em sua construção. Um aspecto interessante é que o filme não busca se prender a uma narrativa e sim buscar uma ambientação poética através da fotografia e do registro (às vezes quase documental) da câmera, centrada na brutalidade e no comportamento doentio das personagens. Este sim é um aspecto notável da primeira obra de Matheus Nachtergaele: a tensão barroca entre um mundo extremamente realista/duro e um mundo quase fantástico e surreal. E Nachtergaele consegue trabalhar tais elementos com certa mestria.
É certo que há em seu filme certos vícios antipáticos e vazios do diretor Cláudio Assis (figura com quem trabalhou e de quem sofreu muita influência): cenas de animais mortos, de ataques histéricos de personagens afeminados, de brutalidade pela brutalidade, etc. Porém Nachtergaele – mais refinado que o amigo pernambucano - não entende o humano de maneira unilateral e nem concebe a religião como apenas um ópio do povo, uma alienação. Sua pesquisa é mais cuidadosa: parece que ele vê na religião e nos ritos ribeirinhos algo paradoxal, fenômenos ao mesmo tempo poéticos e irracionais, ao mesmo tempo significativos e vazios. Seus personagens não são tão bobos como os de Cláudio Assis. O homossexual não é mostrado de maneira pitoresca (como é o próprio Nachtergaele no insípido “Amarelo Manga”), nem a religiosa é mera caricatura de uma puta dissimulada, nem os homens são apenas toscos retratos da violência desvairada e da esquizofrenia.
Há, contudo, muitos problemas que me incomodam. A opção por uma câmera fixa e, muitas vezes, distante da narrativa, torna o ritmo do filme arrastado e incômodo. Não parece exprimir com clareza as intenções estéticas dos outros elementos do discurso fílmico. As metáforas construídas pelo processo de montagem empolgam no início, mas logo depois se tornam convenções enfadonhas. A opção por não utilizar música incidental (refiro-me a trilha sonora instrumental “de fundo”) torna algumas seqüências vazias. Penso que quando não há o apoio narrativo e poético da música incidental em uma cena, esta tem que buscar apoio estético nos sons ambientes, nos ruídos. Fica claro que Nachtergaele não se importou muito com a construção musical de “A Festa da Menina Morta”. O cineasta paulista recorreu, como muitos diretores nacionais o fazem, às canções prontas – estas que na maioria das vezes são utilizadas sem muita finalidade narrativa, mas tão-somente para fazer associações óbvias com as cenas. Não é muito de se admirar tal descaso, já que – para boa parte dos cineastas brasileiros – a música é apenas um mero adereço da imagem.
A meu ver, “A Festa da Menina Morta” não é uma obra-prima, mas não deixa de ser uma experiência estética proveitosa. Há algo de transcendental e epifânico em sua mise-en-scène. Há algo de original em sua maneira de filmar e em sua forma de nos mostrar certos aspectos da cultura brasileira, como os ritos ribeirinhos da Amazônia e as festas religiosas. Estou certo de algo: essa primeira experiência mostra claramente que Nachtergaele é um diretor talentoso (como ator sua qualidade é indiscutível) e que em breve nos trará grandes obras fílmicas.
Alfredo Werney
So queria saber como é que fizeram com os pobres animais morrendo no filme , como por exemplo a porquinha na agua...eu nao como carne ,quando vi essa cena nem quis mais ver nada do filme ...
ResponderExcluirOlha querida, eu não saberia precisar essa informação. Mas te digo com certeza, como o mundo hoje está nessa onda do politicamente correto e está pautado em um discurso de preservação do meio ambiente, dificilmente um filme coloca animais para serem, de fato, mortos. Isso pode causar sérios problemas na exibição. A não ser no caso de cenas em matadouros, em o animal já iria ser abatido realmente (que me parece ser o caso de "Amarelo manga"). Lembro que, certa vez, entrevistaram o cineasta mexicano Alejandro Inharritu sobre o filme "Amores Brutos", em que vários cachorros são "mortos". Ele disse que todos os cães do filme eram treinados e que não houve mal tratos e nem, tampouco, mortes. Acho que é por aí...Penso que não houve mortes propositais no filme de Nachtergaele. Valeu querida!
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