quinta-feira, 5 de maio de 2011

Lionel Messi


LIONEL MESSI: O ACORDO ENTRE APOLO E DIONÍSIO

(Alfredo Werney)

Para Láryos Lima


Lionel Messi, para usar os belos versos de João Cabral de Melo Neto, domina a bola “com malícia e atenção, dando aos pés astúcias de mão”. Alguns jogadores se destacaram pela imensa capacidade de decisão e eficiência no momento do chute final. Luis Fabiano, Liédson, o argentino Batistuta, dentre outros, entrariam nesse time. Outros ganharam notoriedade pela gratuidade lúdica com a bola nos pés, além da facilidade dos dribles e da improvisação em campo. Escalaríamos para essa equipe jogadores como Neymar, Robinho, Denílson, Dener, etc. Jogadores estes que, muitas das vezes, colocaram a fantasia e a exuberância das jogadas acima do resultado do jogo. Messi traz consigo todas essas qualidades. Ele consegue equilibrar o impulso dionisíaco de um Maradona com a cadência apolínea e o domínio de bola de um Zidane, de um Riquelme (aquele dos bons tempos).

O argentino teve uma infância demasiado difícil. Precisava tomar hormônios de alto custo financeiro para que pudesse ter um crescimento compatível com a sua idade. Para tanto, era necessário que o clube de futebol em que jogava na época (o Newell's Old Boys) se responsabilizasse pelo tratamento. O time não teve como custear a aplicação de hormônios no garoto de baixa estatura. O Barcelona, impressionado com o desempenho do futebolista, levou-o para a Espanha na mais tenra idade (14 anos) e abrigou a família argentina na Europa. Além disso, custeou todo o tratamento do atleta de Rosário. Lionel era apenas uma promessa. Em pouco tempo virou um fato. Saindo do time mirim para o principal, firmou seu nome na história do clube espanhol. Mais tarde tomaria a vaga de um de seus grandes inspiradores do futebol, que não vinha desempenhando um futebol à altura da equipe blaugrana: Ronaldinho Gaúcho. A partir de então, inicia-se a melhor de suas fases. Em 2009 foi consagrado com o título de melhor jogador do mundo, prêmio dado pela FIFA.

Certamente, o que mais marca o futebol de Messi é a sua capacidade, quase sobrenatural, de dominar e correr com a bola imantada aos pés. A bola parece de fato uma parte de seu corpo. Apenas lhe é retirada com uma jogada faltosa. Há entre o argentino e o objeto esférico, exageros à parte, uma relação quase simbiótica. Mas não é somente este aspecto que nos chama a atenção. O equilíbrio entre a criação, a inventividade poética em meio à narrativa quase linear do jogo europeu, a precisão do chute e o controle das emoções (que é de grande valor nas partidas mais tensas) são, possivelmente, as maiores virtudes do jogador. Nesse sentido, nenhum outro atleta da atualidade ergueu-se a tão alto patamar.

Ronaldo nos disse, certa vez, que o futebol de Lionel Messi parecia com os jogos de vídeo-game. E de fato, algumas vezes, custamos a acreditar que as jogadas dele, de tão deslumbrantes e incomuns, sejam mesmo possíveis de ocorrer na realidade das quatro linhas do campo. A façanha de seu compatriota Maradona, na Copa de 86 contra a seleção da Inglaterra, já fora conseguida pelo atleta pelo menos umas três vezes. Messi une à disciplina tática européia o elemento lúdico e a capacidade de improvisação do futebol latino-americano. Não é homem de fazer firulas vazias e estéreis. Seus cortes e seus volteios são milimétricos. O chute, além de forte, é preciso como a talha de um mestre artesão de longa experiência. Raramente reclama e possui uma simpatia que mais nos aparenta ser um de nossos amigos das peladas dos finais de semana. Ademais, é capaz de desatar os mais indesatáveis nós da tática futebolística.

Messi concilia em campo, com rara mestria, os impulsos contraditórios que são comuns a todos os esportistas: a explosão e a contensão; a irrupção poética e o prosaísmo linear; a velocidade desmedida e o domínio tranqüilo da bola. Apesar de não ser exatamente um “esteta da bola”, seu futebol possui uma plástica visual muito bonita. Uma espécie de beleza neoclássica: sóbria e serena. Mas, se é verdade que “jogada bonita não faz o time vencer” (como esbravejam muitos torcedores por aí), o atacante só a utiliza no momento oportuno. E apenas realiza um lance repleto de beleza na medida em que ele pode resultar na explosão sagrada do gol.

Roberto da Matta, importante antropólogo brasileiro, disse que o futebol anglo-saxão é pensado e jogado com “ênfase no controle do físico e na coordenação de indivíduos para formar uma coletividade”. Trata-se de uma concepção de jogo que procura ter um total domínio “do mundo exterior ou do que vem de fora”. Embora Messi atue em uma equipe espanhola - que possui, em geral, um futebol mais flexível e menos mecânico do que o inglês e o alemão - ele está, de alguma forma, amarrado em um esquema tático um tanto quanto rigoroso e racional. Sua individualidade também está limitada pela idéia de coletividade de que nos fala Matta. O fato é que, como observamos no dia-a-dia do esporte, muitas vezes essa tal coletividade não funciona. Esta idéia de sinergia torna-se mecanizada e infértil nas partidas mais truculentas e nervosas.

O racionalismo tático procura sobrepor-se às invenções individuais, pelo menos é o que vemos na maioria das partidas do futebol europeu (e também, em certa medida, no futebol de muitos clubes brasileiros da atualidade). Porém, às vezes, o lado inteligível desse sistema se desestabiliza, pois eis que aparece algo inesperado e fora de controle. Os craques são essas forças “que vem de fora” e desestabilizam a ordem dos sistemas e instauram no mundo futebolístico a dimensão do ininteligível. Messi figura dentre estes. Malícia e inteligência, êxtase e atenção caminham lado a lado do seu futebol. No banquete preparado por Lionel, no mesmo prato comem Apolo e Dionísio.

Um comentário:

  1. oi alfredo!
    creio q em breve nos encontraremos pessoalmente, falei com o roger e ele falou que logo irá convidar todos os redatores do portal proposta para que todos se conheçam; estou ansiosa pra conhecer os demais e a vc!
    bom, fiquei muito grata em saber que você irá me ajudar, muito mesmo. Vc recebeu meu e-mail?
    caso não, este é o meu e-mail: Vanessateodorotrajano@yahoo.com.br
    Talvez tenha falhado na hora do envio, sei lá. Estou aguardando resposta.
    abraçoss!


    Vanessa Trajano - conviteparalervanessatrajano.blogspot.com

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